Programas de integridade na nova lei de licitações
Compliance

Programas de integridade na nova lei de licitações

Marcelo Rotta
20 de fev, 2025
9 mins

A Lei nº 14.133/2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos) tornou obrigatória a criação de programas de integridade pelas empresas licitantes vencedoras. Para deixar bem claro desde o início desta nossa conversa, licitante é qualquer empresa que participa de uma licitação, ok? Mas voltando ao tópico das licitações, o que é um programa de integridade e para que ele serve?

Neste artigo vamos abordar o que são os programas de integridade, por que eles são importantes, quais são seus benefícios, bem como os 5 pilares dos programas de integridade, além de quais são os passos para implementá-los no seu negócio. Confira!

O que são Programas de Integridade?

De acordo com o Decreto nº 11.129/2022, que revogou o Decreto nº 8.420/2015 e estabeleceu novas normas em relação à Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), os programas de integridade são um conjunto de “mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades”; ou seja, um conjunto para a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes dentro das organizações. Eles têm como objetivo prevenir, detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira; além de fomentar e manter uma cultura de integridade no ambiente organizacional.

Em outras palavras, os programas de integridade são um conjunto de regras e procedimentos que as empresas criam para garantir que todos sigam as leis e ajam de forma ética. Eles ajudam a prevenir problemas como fraudes, corrupção e outras irregularidades que podem ocorrer em contratos com o governo, por exemplo. Trocando em miúdos, é como se a empresa criasse um “manual de boas práticas” para evitar problemas e garantir que tudo seja feito de forma correta.

Nesse sentido, a Controladoria-Geral da União (a CGU) entende que o programa de integridade nada mais é do que um programa de compliance para prevenção, detecção e correção de danos causados pelo licitante, previstos na Lei Anticorrupção.

Atualização importante: Decreto nº 12.304/2024 e a nova lei de licitações

Até recentemente, os programas de integridade eram vistos como um diferencial estratégico na relação entre empresas e a Administração Pública, regulamentados pelo Decreto nº 11.129/2022 — um decreto com foco preventivo, aplicável a qualquer pessoa jurídica, mesmo sem relação direta com o setor público.

Mas agora o jogo mudou: com o Decreto nº 12.304/2024, regulamentando a exigência prevista na nova lei de licitações (Lei nº 14.133/2021), a implementação de programas de integridade se torna obrigatória para contratos públicos de grande vulto, ou seja, acima de R$ 200 milhões em contratos federais.

Essa nova regulamentação não apenas reforça a importância da integridade nas relações público-privadas, como também impõe prazos específicos para a implementação dos programas e sanções contratuais em caso de descumprimento. Em resumo: integridade não é mais apenas um selo de boa prática — ela passou a ser condição de sobrevivência e continuidade nos contratos públicos de alto valor.

Por isso, mais do que nunca, entender as diferenças entre os decretos e estar preparado para atender às novas exigências pode ser o divisor de águas entre fechar grandes contratos ou ser desclassificado na largada.

Comparativo entre os Decretos nº 11.129/2022 e nº 12.304/2024

AspectoDecreto nº 11.129/2022Decreto nº 12.304/2024
FinalidadeRegulamentar a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013) com foco na prevenção e correção de irregularidades.Regulamentar a exigência de programas de integridade na Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021).
ObrigatoriedadeVoluntário, mas considerado critério atenuante de penalidades.Obrigatório para contratos de grande vulto (valores a partir de R$ 200 milhões).
AplicaçãoQualquer empresa (com ou sem contrato com a administração pública).Empresas vencedoras de licitações públicas para contratos de grande vulto.
ConsequênciasPode reduzir multas e sanções administrativas.Pode acarretar sanções contratuais, multas e rescisão de contrato se descumprido.

Por que os programas de integridade são importantes?

Imagine que o governo federal está contratando uma empresa para construir um hospital. Para garantir que o dinheiro público seja usado de forma correta e que não haja fraudes, o governo exige que a empresa tenha um programa de integridade. Isso significa que a empresa precisa seguir regras claras e agir de forma transparente para que seja firmado o contrato público-privado, ou seja, o contrato entre o governo federal e a empresa que venceu o processo de licitação.

Outra possível situação de sucesso da aplicação de um programa de integridade é o da empresa hipotética Y. Uma empresa de construção civil implementou um programa de integridade após ser multada por irregularidades em uma licitação pública. Com o programa, ela criou um código de conduta, treinou seus funcionários e implementou um canal de denúncia. Como resultado, a empresa não apenas evitou novas multas, mas também ganhou mais contratos com o governo, já que passou a ser vista como mais confiável. Essa é a importância prática dos programas de integridade.

Benefícios dos programas de integridade

Os programas de integridade não são um conjunto de regras escritas em pedra, mas um sistema dinâmico que envolve pessoas, processos e tecnologia. Além de cumprir com as exigências legais, os programas trazem diversos benefícios para as empresas: 

  • Melhoria da reputação: empresas com programas de integridade bem estruturados são vistas como mais confiáveis e éticas, o que pode atrair mais clientes e parceiros.
  • Redução de riscos legais e financeiros: ao prevenir fraudes e irregularidades, a empresa evita multas, processos judiciais e perdas financeiras.
  • Vantagem competitiva: em licitações públicas, ter um programa de integridade pode ser um critério de desempate, dando à empresa uma vantagem sobre os concorrentes.
  • Cultura organizacional fortalecida: um programa de integridade promove uma cultura de transparência e ética, o que melhora o ambiente de trabalho e a motivação dos funcionários.

Principais aspectos do Decreto nº 11.129/2022

Segundo o ensaio “Programa de Integridade: diretrizes para empresas privadas” da CGU, os cinco pilares dos programas de integridade podem assim ser resumidos:

  1. Comprometimento e apoio da alta direção: a liderança da empresa (diretores, presidentes e conselheiros) deve fomentar uma cultura ética e de respeito às leis e comprometer-se com a aplicação efetiva do programa de integridade na organização.
  2. Instância responsável pelo Programa de Integridade: Qualquer que seja a instância responsável, ela deve ser dotada de autonomia, independência, imparcialidade, recursos materiais, humanos e financeiros para o pleno funcionamento, com possibilidade de acesso direto, quando necessário, ao mais alto corpo decisório da empresa.
  3. Análise de perfil e riscos: A empresa deve conhecer seus processos e sua estrutura organizacional, identificar sua área de atuação e principais parceiros de negócio, seu nível de interação com o setor público – nacional ou estrangeiro – e consequentemente avaliar os riscos para o cometimento dos atos lesivos da Lei nº 12.846/2013.
  4. Estruturação das regras e instrumentos: Com base no conhecimento do perfil e riscos da empresa, deve-se elaborar ou atualizar o código de ética ou de conduta e as regras, políticas e procedimentos de prevenção de irregularidades; desenvolver mecanismos de detecção ou reportes de irregularidades (alertas ou red flags; canais de denúncia; mecanismos de proteção ao denunciante); definir medidas disciplinares para casos de violação e medidas de remediação. Para uma ampla e efetiva divulgação do Programa de Integridade, deve-se também elaborar plano de comunicação e treinamento com estratégias específicas para os diversos públicos da empresa.
  5. Estratégias de monitoramento contínuo: É necessário definir procedimentos de verificação da aplicabilidade do Programa de Integridade ao modo de operação da empresa e criar mecanismos para que as deficiências encontradas em qualquer área possam realimentar continuamente seu aperfeiçoamento e atualização. É preciso garantir também que o Programa de Integridade seja parte da rotina da empresa e que atue de maneira integrada com outras áreas correlacionadas, tais como recursos humanos, departamento jurídico, auditoria interna e departamento contábil-financeiro.

Como se vê, os cinco pilares acima ilustrados representam, na realidade, um resumo dos parâmetros estabelecidos pelo Decreto nº 11.129/2022:

I – comprometimento da alta direção da pessoa jurídica, incluídos os conselhos, evidenciado pelo apoio visível e inequívoco ao programa;

II – padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade, aplicáveis a todos os empregados e administradores, independentemente de cargo ou função exercidos;

III – padrões de conduta, código de ética e políticas de integridade estendidas, quando necessário, a terceiros, tais como, fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados;

IV – treinamentos periódicos sobre o programa de integridade;

V – análise periódica de riscos para realizar adaptações necessárias ao programa de integridade;

VI – registros contábeis que reflitam de forma completa e precisa as transações da pessoa jurídica;

VII – controles internos que assegurem a pronta elaboração e confiabilidade de relatórios e demonstrações financeiros da pessoa jurídica;

VIII – procedimentos específicos para prevenir fraudes e ilícitos no âmbito de processos licitatórios, na execução de contratos administrativos ou em qualquer interação com o setor público, ainda que intermediada por terceiros, tal como pagamento de tributos, sujeição a fiscalizações, ou obtenção de autorizações, licenças, permissões e certidões;

IX – independência, estrutura e autoridade da instância interna responsável pela aplicação do programa de integridade e fiscalização de seu cumprimento;

X – canais de denúncia de irregularidades, abertos e amplamente divulgados a funcionários e terceiros, e de mecanismos destinados à proteção de denunciantes de boa-fé;

XI – medidas disciplinares em caso de violação do programa de integridade;

XII – procedimentos que assegurem a pronta interrupção de irregularidades ou infrações detectadas e a tempestiva remediação dos danos gerados;

XIII – diligências apropriadas para contratação e, conforme o caso, supervisão, de terceiros, tais como, fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados;

XIV – verificação, durante os processos de fusões, aquisições e reestruturações societárias, do cometimento de irregularidades ou ilícitos ou da existência de vulnerabilidades nas pessoas jurídicas envolvidas;

XV – monitoramento contínuo do programa de integridade visando seu aperfeiçoamento na prevenção, detecção e combate à ocorrência dos atos lesivos previstos no art. 5º da Lei nº 12.846, de 2013 ; e

XVI – transparência da pessoa jurídica quanto a doações para candidatos e partidos políticos.

3 passos para implementar um programa de integridade

Como já tivemos a oportunidade de escrever (confira aqui), não há fórmula pronta, nem uma bala de prata para a implementação de programas de integridade.

Na realidade, é preciso seguir três passos básicos.

Primeiro passo: entenda o contexto da organização

Antes de tudo, é preciso entender o contexto da organização, conhecer as principais partes interessadas, formar o time de integridade e sensibilizar os colaboradores.

É que sem engajar todos os envolvidos, o compliance empresarial torna-se apenas mais uma ferramenta burocrática dentro da organização. E lembre-se: não há um modelo único, por isso é necessário ter visão acerca das principais obrigações de compliance que a empresa, mandatoriamente ou voluntariamente, precisa cumprir.

Nessa fase, por exemplo, você pode definir quais serão as pessoas diretamente envolvidas com o projeto, levantar as principais preocupações da organização em relação ao tema e promover palestras de sensibilização na sua empresa.

Cabe destacar, ainda, que o Decreto n. 11.129/2022 entende que os programas de integridade deverão levar em consideração:

I – a quantidade de funcionários, empregados e colaboradores;

II – o faturamento, levando ainda em consideração o fato de ser qualificada como microempresa ou empresa de pequeno porte;

III – a estrutura de governança corporativa e a complexidade de unidades internas, tais como departamentos, diretorias ou setores, ou da estruturação de grupo econômico;

IV – a utilização de agentes intermediários, como consultores ou representantes comerciais;

V – o setor do mercado em que atua;

VI – os países em que atua, direta ou indiretamente;

VII – o grau de interação com o setor público e a importância de contratações, investimentos e subsídios públicos, autorizações, licenças e permissões governamentais em suas operações; e

VIII – a quantidade e a localização das pessoas jurídicas que integram o grupo econômico.

Segundo passo: faça uma análise de riscos

Este passo vai exigir de você um pouco mais de tempo, esforço e conhecimento técnico, em razão da necessidade de se buscar as principais fontes de riscos de compliance dentro da sua empresa.

A avaliação de riscos de compliance envolve as etapas de identificação, análise, avaliação, tratamento e comunicação dos riscos, por meio da análise de documentos e realização de entrevistas pessoais com os pontos focais da organização.

O Decreto n. 11.129/2022, do mesmo modo, assinala que os programas de integridade devem ser estruturados, aplicados e atualizados de acordo com as características e os riscos atuais das atividades de cada pessoa jurídica, a qual, por sua vez, deve garantir o constante aprimoramento e a adaptação do referido programa, visando garantir sua efetividade. Esse é um passo fundamental para o sucesso do compliance dentro da sua empresa.

Terceiro passo: implemente as ações

O terceiro passo corresponde à implementação dos planos de ação levantados na etapa anterior. É chegada a hora de “botar a mão na massa”, para dar início à elaboração do código de conduta e à adequação das políticas, processos e procedimentos de compliance dentro da organização.

Nesta etapa, você pode criar, também, normas internas para a definição de papéis e responsabilidades dos órgãos internos de compliance, tais como o Comitê de Ética e a própria função de compliance.

Por fim, e não menos importante, você deve realizar treinamentos e capacitações a todas as partes interessadas, com o objetivo de engajar cada vez mais as pessoas responsáveis pelo dia a dia da sua empresa.

Desafios na implementação dos programas

Implementar um programa de integridade não é simples e pode enfrentar alguns desafios:

  • Resistência interna: alguns funcionários ou líderes podem resistir às mudanças, especialmente se acharem que o programa é burocrático.
  • Custos iniciais: criar e manter um programa de integridade pode exigir investimentos em tecnologia, treinamentos e pessoal.
  • Complexidade em empresas grandes: em empresas com muitas filiais ou operações internacionais, pode ser difícil garantir que todas as unidades sigam as mesmas regras.

Integração com outras áreas da empresa

Um programa de integridade não funciona isoladamente. Ele precisa estar integrado a outras áreas da empresa, como:

  • Recursos Humanos: para garantir que os funcionários sejam treinados e que as políticas de integridade sejam incluídas nos processos de contratação e avaliação de desempenho.
  • Jurídico: para garantir que as políticas estejam alinhadas com as leis e os regulamentos.
  • Auditoria Interna: para monitorar o cumprimento das regras e identificar áreas de melhoria.
  • Tecnologia da Informação: para implementar sistemas que facilitem o monitoramento e a gestão de riscos, como softwares de denúncia e análise de dados.

Prepare sua empresa para os novos tempos

A implementação de um programa de integridade já deixou de ser uma opção. Com o Decreto nº 12.304/2024 em vigor, a conformidade é condição obrigatória para competir em contratos públicos de grande vulto. Antecipe-se, fortaleça a sua cultura ética e posicione sua empresa como protagonista em um mercado cada vez mais exigente e transparente. Entre em contato conosco e descubra como podemos te ajudar.

Perguntas frequentes (FAQ)

O que é um programa de integridade?

É um conjunto de regras e procedimentos que uma empresa cria para garantir que todos sigam as leis e ajam de forma ética.

Por que é importante ter um programa de integridade?

Ele ajuda a prevenir fraudes e irregularidades, especialmente em contratos com o governo.

Quem precisa ter um programa de integridade?

Empresas que participam de licitações públicas, especialmente aquelas que ganham contratos grandes, como obras acima de R$ 200 milhões, mas existem casos que consideram obras com valores menores, como R$ 200 mil.

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